sábado, 25 de maio de 2013

Sermão do Monte XXVII: O crente e o jejum

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Capítulo XXVII

O crente e o jejum

Alejandro G. Frank

Introdução

Começamos um novo capítulo do Sermão do Monte, ainda no desdobramento dos princípios ensinados pelo Senhor Jesus no capítulo 6 de Mateus. Em estudos anteriores vimos que Jesus apresentou um princípio geral, no verso 1: “Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste”. A partir desta advertência em relação à falsa imagem de justiça e religião, aquela que busca a glória e o reconhecimento dos homens e não de Deus, Jesus passa na sequência a desdobrar tal ensino em diferentes aplicações práticas que abrangem três aspectos básicos da vida. Já vimos duas delas: a primeira trata sobre como dar esmolas glorificando a Deus e não a nós mesmos (versos 2 a 4) e, portanto, trata sobre os aspectos materiais na vida religiosa; e a segunda trata sobre como orar glorificando a Deus e não a nós mesmos (versos 5-14), o que alude aos aspectos espirituais na vida religiosa.
Estamos agora frente a uma nova aplicação, a última das três dadas por Jesus no Sermão do Monte. Esta nova aplicação trata sobre como fazer jejum para glorificar a Deus e não a nós mesmos e, consequentemente, aborda o aspecto físico do ser humano diante da vida religiosa. Vejamos o que nos diz este ensino:
“Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa. Tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto, com o fim de não parecer aos homens que jejuas, e sim ao teu Pai, em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.” (Mateus 6.16-18)
Vemos novamente mais um exemplo de falsa aparência de piedade e religião utilizada pelo homem hipócrita. O verdadeiro intuito dos hipócritas com o jejum não era agradar a Deus, mas serem louvados diante dos homens pela piedade com que realizavam esta prática. Mas Jesus se preocupou com seus discípulos, para que estes aprendessem a prática correta que agrada a Deus.

Atitudes negativas contra o jejum

O jejum é uma prática muito comum em praticamente todas as religiões do mundo. Há religiões que são muito rigorosas com tais práticas e guardam datas específicas do ano para realiza-las. Parece ser que o jejum é um aspecto quase central e comum em todos os tipos de adorações do ser humano. Há pessoas que o fazem para serem agradáveis a seus deuses, outras para pagar votos de promessas, outras para alcançar perdão e outras podem fazê-lo para serem respeitadas como piedosas diante dos homens, como no caso lido neste texto. É por tal motivo que muitas vezes o jejum é desconsiderado e até desprezado no meio evangélico. Todas essas confusões a respeito do jejum têm gerado muitas vezes uma resistência a realizar esta prática. Já ouvi argumentos de cristãos tais como “fazer jejum só leva à loucura das pessoas, para que estas imaginem que vêm anjos e visões”, ou “não há apoio nas epístolas para que as igrejas dos gentios pratiquem o jejum, isto era somente uma prática judaica”. Estes tipos de reações acredito que sejam influenciadas não apenas pelas práticas de outras religiões, mas também por muitos excessos que aconteceram e seguem acontecendo dentro do próprio seio do cristianismo. Por exemplo, na idade média era muito comum algumas pessoas alucinarem e terem visões de profecias totalmente contrárias às Escrituras. Muitas dessas visões eram realmente fundadas em mentes místicas, somadas aos excessos da prática do jejum. Também podemos ver algo similar até hoje em algumas linhas do pentecostalismo. Porém, não podemos usar estes aspectos como base para a nossa argumentação conta tal prática e a seguir explicarei o motivo.
Em primeiro lugar, quem estiver acompanhado nossos estudos sobre o Sermão do Monte, poderá lembrar alguns princípios que já vimos que nos impedem de reagir de tal maneira. O Evangelho de Jesus Cristo não é uma reação negativa a todo vento de doutrina que encontramos por ai, em outras religiões. Cristo veio nos ensinar a verdadeira religião. Ele veio nos trazer a mensagem de boas novas. Portanto, o Evangelho não consiste em reações, mas em ações concretas que busquem a glória de Deus. Se pensarmos desta maneira, a nossa principal questão não será se o jejum é praticado por outras religiões que o interpretam de maneira errada. A nossa principal questão será se o jejum é realmente uma prática instruída por Deus e se ele realmente se agrada em que a pratiquemos. Vejam que a mensagem do Evangelho nos leva a olhar para Cristo, de maneira que entendamos a vontade do Pai. Isto nos liberta de muitos preconceitos e entendimentos errados. É comum encontrar cristãos que constroem sua teologia baseada no que há de errado por ai. O fundamentalismo distorcido (não o movimento original) foi radicalmente contra as bebidas alcoólicas, muitas vezes utilizando argumentos bíblicos para isto. O que eles fizeram foi criar uma doutrina baseada nos aspectos negativos da sociedade. Havia grandes problemas sociais em relação ao álcool nos Estados Unidos, porém, a Palavra de Deus nunca condenou essas bebidas, apenas a embriaguez. Eles perderam o foco do Evangelho, que visa o domínio próprio e que consequentemente é contra a embriaguez, e construíram o ensinamento em base à situação social do momento. Isto tem acontecido com as músicas, com as vestimentas e com muitas outras coisas. O jejum não é uma exceção.
Em segundo lugar, explicamos várias vezes ao longo do estudo do Sermão do Monte que os ensinamentos dados por Jesus são para seus discípulos em todos os tempos. Eles contêm os aspectos essenciais para a vida cristã do ser humano. Não é um tratado sobre aspectos meramente judaicos, mas um ensinamento sobre como os discípulos de Cristo devem viver. Novamente aqui temos um aspecto positivo ao invés de negativo: “quando jejuardes” (v.16a). Há pessoas que entendem o Sermão do Monte como se este apenas fosse um ensinamento para nos condenar, para nos mostrar quão longe estamos dos padrões de Cristo. Se olharmos do ponto de vista negativo podemos afirmar que isto é verdade, não discordo disso. Como seres humanos caídos, somos incapazes de vivermos uma vida perfeitamente santa diante de Deus, senão não precisaríamos da graça diária de Deus dada pelo sacrifício do seu Filho. Não obstante, o Sermão do Monte foi primeiramente pregado para homens que creram em Jesus como sendo o Messias. Foi dado a seus discípulos. Cremos que tais pessoas são as que foram regeneradas e têm o auxílio e o poder do Espírito Santo para viver uma vida conforme a vontade de Deus, mesmo que sendo imperfeitos. Nosso alvo é a santidade, e o Sermão do Monte nosso instrutivo. Portanto, eu diria que o Sermão do Monte com todos seus ensinamentos é uma mensagem do Evangelho para o homem sem Cristo, para que este veja quão imperfeito e pecador é e que não consegue ser salvo por suas próprias obras e, também, é uma mensagem do Evangelho para o homem com Cristo, para que este veja como deve se conduzir e viver como cristão nesta terra, sendo luz do mundo e sal da terra. Portanto, se o jejum foi dado neste contexto, entendemos que ele é também para nós hoje.
Além disso, temos mais argumentos para dar àqueles que dizem que o jejum é coisa do Antigo Testamento e dos judeus. Considere por exemplo o texto de Marcos 2.18-20. Jesus foi questionado do por que seus discípulos não jejuavam e os de João sim. Jesus lhes respondeu dizendo: “Dias virão, contudo, em que lhes será tirado o noivo; e, nesse tempo, jejuarão”. Ele, Jesus, é o noivo da sua igreja, a noiva. Ele diz que quando ele não estaria mais, seus discípulos jejuariam. Por acaso se trata dos três dias em que ele esteve morto? Acredito que seja mais natural entender o texto como sendo o tempo posterior, a era da Igreja de Cristo, onde ele não está mais presente fisicamente. Esse tempo inclui hoje, até a sua vinda em poder e glória. Ainda, temos também relatos em Atos dos apóstolos dos primeiros discípulos jejuando. Por exemplo, em Atos 13.1-4 eles estavam em continuo jejum e oração e quando tiveram uma missão diante deles jejuaram mais uma vez ainda, sempre acompanhado de orações.
Tendo dito isto, agora buscaremos entender a questão do jejum e a sua importância para nossas vidas cristãs.

Entendendo o jejum nos tempos bíblicos

Para entendermos como o Senhor espera que seus discípulos pratiquem o jejum, primeiramente precisamos entender do que se trata o jejum. Podemos dizer que em todos os casos bíblicos o jejum significa abstinência de alimentos e, em alguns casos, abstinência total (inclusive líquidos). Em outros casos se trata de abstinência de alimentos especiais ou deleitosos. Em todos os casos, esta abstinência tem um propósito muito claro e especial: a dedicação espiritual para se consagrar a Deus mediante a meditação e oração. Hoje escutamos pessoas que dizem fazer jejum de assistir TV, jejum de vídeo games e internet, jejum de atividades, etc. Acredito que seja muito bom pararmos de vez em quando de muitas coisas que nos desconcentram ou que nos seguram quase como um vício, mas isso não significa que estamos jejuando conforme o ensinamento bíblico.
Na Bíblia encontramos muitos exemplos de jejum no sentido estrito de abstinência de alimentos, sempre com um propósito bem claro e definido. Vejamos alguns exemplos:
·         Ester 4.16 e Esdras 8.21-23: Jejum por pedido de direção e graça de Deus para uma missão.
·         2 Samuel 12.16: Davi jejua pedindo misericórdia de Deus pela vida do seu filho recém nascido.
·         2 Crónicas 20.2-3: Josafá jejua pedindo socorro a Deus por causa dos seus inimigos.
·         Jeremias 36.7-8: É anunciado um jejum geral do povo, para apregoar um arrependimento nacional, para preparar nesse arrependimento às almas para buscarem a Deus e ouvirem a sua palavra por meio da leitura da lei.
·         Neemias 1.3-6: Neemias jejua para interceder e confessar os pecados do seu povo.
·         Lucas 2.36-38: Ana servia no templo por meio dos jejuns e orações, para sua dedicação total à adoração a Deus.
Todavia, o maior exemplo de jejum, descrito na Palavra de Deus, se encontra em Mateus 4.1-11. É o jejum de quarenta dias que Jesus fez no deserto como preparação para o início do seu ministério. Foi um tempo de preparação especial que Jesus teve que passar. Ele se preparou em jejum durante todo esse tempo e no final chegou a prova, a tentação de Satanás. O jejum é apresentado neste texto como elemento essencial da preparação de Cristo para enfrentar a tentação e começar após isso seu difícil ministério.
Bem, mas considerando todos esses casos podemos nos preguntar: qual é o propósito do jejum? Para que jejuar? Não era suficiente em todos esses casos citados apenas a oração e meditação? Por que passar fome? Acredito que a resposta mais clara a estes interrogantes esteja no texto de Esdras 8.21-23: “Então, apregoei ali um jejum junto ao rio Aava, para nos humilharmos perante o nosso Deus, para lhe pedirmos jornada feliz para nós, para nossos filhos e para tudo o que era nosso”. Esdras coloca claramente o propósito primário e o propósito final do jejum que realizaram. O propósito final que eles tinham era pedir uma jornada feliz para todos eles na viagem que tinham que realizar. Isso é o que eles queriam pedir a Deus, o que eles esperavam receber graciosamente do Senhor. Ora, Esdras diz que para isso eles jejuaram. Por que jejuaram? Ele diz: “para nos humilharmos perante o nosso Deus”, este era o propósito primário do jejum e, através dele, eles esperavam alcançar o favor de Deus e ter uma jornada feliz. Seguindo este texto podemos ver que o propósito do jejum é a humilhação diante de Deus. Mediante o jejum reconhecimentos a nossa dependência e miséria diante dEle. Não obstante, o jejum não tem o propósito de manipular ao Senhor, nem garante que a nossa oração será atendida conforme nossos desejos. Em 2.Samuel 12.15-25 podemos encontrar um bom exemplo disto. Nesse texto vemos que o filho recém-nascido de Davi adoeceu gravemente. Davi começou orar e jejuar pela vida da criança, mas o Senhor não lhe concedeu o pedido de Davi e a criança morreu. Davi não pode torcer a decisão de Deus, mesmo tendo orado e jejuado.
Uma segunda pergunta que pode surgir em base ao exposto é a seguinte: Por que esta humilhação tem que vir por meio da abstinência dos alimentos? Não é suficiente a oração? Já vimos no estudo sobre a oração que esta também nos leva a nos humilharmos diante de Deus. Porém, deixem-me lhes explicar melhor o porquê do jejum como humilhação especial: Jejum significa abstinência de alimentos. O alimento é a essência da força humana. Através dos alimentos temos as forças necessárias para empreendermos qualquer desafio. Notem que quando Deus quis ensinar ao povo de Israel a dependerem dele, ele o fez através do alimento, dando-lhes o Maná. O Maná, o alimento diário de Deus para seu povo, era um símbolo da dependência de Deus na peregrinação pelo deserto. Para o ser humano é humilhante depender de um Ser superior que lhe providencie o sustento e assim Deus usou este método de ensino para seu povo aprender a humildade e dependência. Assim sendo, vemos que o jejum nos leva a um estado de fraqueza, pois ficamos sem o essencial para a vida. Por outro lado, o jejum nos leva a um estado de fortaleza espiritual, pois nos aproxima mais da presença de Deus, através da dependência dele. O jejum nos ajuda a lembrarmos durante todo dia aquilo que estamos trazendo em oração diante de Deus. Também nos enfraquece, de maneira que não tenhamos forças para o trabalho e atividades rotineiras e, assim, possamos refletir mais sobre nós e nosso estado espiritual. Observe um detalhe sobre esta última afirmação: o jejum envolve sempre um estado meditativo, reflexivo. Sempre que vemos na Bíblia um homem ou uma mulher jejuando, podemos vê-lo num estado de reflexão, de separação, de oração e de humilhação. Não podemos encarar o jejum como uma atividade externa, mecânica e prática. O jejum é um meio para nos aproximarmos a Deus e com tal atitude devemos abordá-lo.
Outro propósito que podemos encontrar no jejum tem a ver com a disciplina do ser humano como um todo. A Bíblia nos diz que o ser humano é corpo, mente e espírito. O ser humano é uma unidade entre essas partes, embora a tendência humana seja exaltar a matéria, o corpo. Neste caso, o jejum é uma disciplina por meio da qual reduzimos esta parte da unidade do ser humano, tornando-nos fisicamente fracos, e exaltando o espírito, por meio da meditação e oração.   Vemos isto na preparação para o ministério de Jesus. Ele jejuou no deserto e passou fome, ficou fraco. O seu estado de humilhação se tornava maior ainda, Satanás tentou usar este ponto tentando-o a transformar as pedras em pão. Como é possível que o Deus encarnado esteja passando fome? Esse era um dos argumentos de Satanás para tentar Jesus. Mas o Senhor mostrou que a sua supremacia estava no Espírito e não na carne. A carne, a fome, a fraqueza, foi controlada pelo Espírito e não o contrário. Totalmente oposto ao que vemos no dia-a-dia: pessoas controladas pela carne, pelos impulsos e desejos dos seus corpos. Portanto, o jejum nos ajuda a lembrar de que “não só de pão viverá o homem, mas de tudo que procede da boca do Senhor viverá o homem” (Deuteronômio 8.4).

O problema dos fariseus quanto ao jejum

No texto que estamos estudando vemos que mais uma vez os hipócritas estavam utilizando um instrumento santo dado por Deus para a sua adoração como um instrumento para a própria glória e honra deles. Este era o problema dos fariseus. Eles queriam mostrar a religiosidade e espiritualidade que tinham pelo fato de jejuarem. O costume que guardavam eles era de mostrar seu jejum e eles faziam isto caminhando pelas ruas com suas vestes rasgadas e com cinza sobre a cabeça, mostrando assim sua penitência. Mais do que isso, os fariseus eram tão estritos e severos com esta prática que enquanto a Lei de Moisés indicava que os judeus deveriam jejuar uma vez no ano, eles o faziam duas vezes na semana! A religião do homem sem Deus pode ser muitas vezes muito mais pesada, mas severa, mais exigente que qualquer adoração verdadeira a Deus. Isto pode nos surpreender, pois muitas vezes acreditamos que não há nada mais difícil do que vivermos como cristãos. Mas observe o rigor de vida que hoje levam alguns monges budistas, por exemplo. Tenho certeza que em rigor e disciplina externa eles são muito mais esforçados que qualquer outra pessoa. Mas isso serve? Claro que não. O problema é que o ser humano muitas vezes está disposto a carregar inúmeros esforços próprios, tais como os dois jejuns semanais dos fariseus, por mero orgulho, para ser ele mesmo merecedor diante de Deus. Os fariseus acreditavam que eles eram justos diante de Deus por esse esforço e rigor nas suas vidas. Mas Jesus ensinou aqui que de nada serve um rigor religioso carregado de orgulho próprio, de justiça própria, para vanglória ao invés de ser para a glória de Deus.
Portanto, o problema todo não estava no jejum em si mesmo, mas na atitude em que estes homens encaravam tal prática. Eles poderiam praticar seus jejuns com o rosto lavado, sem transparecer como se fosse uma prática difícil que somente santos especiais como eles poderiam ser capazes de praticá-la. Atitudes similares encontramos até hoje nas igrejas. Pense em pessoas, talvez em você mesmo, quando realiza algum trabalho na igreja e ao invés de fazê-lo com alegria, o faz demonstrando que isso é um sacrifício para você. Outros o vêm e pensam: “como é esforçado esse trabalho para o irmão, como ele é fiel para suportar essa obra”. Nesse caso, você ou a pessoa que for está roubando glória para si mesmo. Está caminhando, em um sentido figurado, com panos rasgados e cinza sobre a cabeça, mostrando a todos o quão importante é o esforço religioso que está realizando. Sempre que mostramos aos outros que nos custa alguma coisa servirmos a Deus, que estamos abrindo mão de algo para realizar a obra de Cristo, de certa forma criamos um meio para a admiração e louvor dos homens. A atitude certa deveria ser a que nos ensinou Jesus em Lucas 17.10 quando disse que após fazermos o que nos for encomendado, deveríamos dizer: “servos inúteis somos, pois apenas fizemos o que devíamos fazer”.
Mas também encontramos outro problema sobre o jejum já no Israel do Antigo Testamento. Os judeus já tinham sido repreendidos por pensarem que seriam ouvidos apenas por jejuar, eis aqui uma boa descrição de uma vida religiosa vazia, apenas baseada em práticas externas: 
“Clama a plenos pulmões, não te detenhas, ergue a voz como a trombeta e anuncia ao meu povo a sua transgressão e à casa de Jacó, os seus pecados. Mesmo neste estado, ainda me procuram dia a dia, têm prazer em saber os meus caminhos; como povo que pratica a justiça e não deixa o direito do seu Deus, perguntam-me pelos direitos da justiça, têm prazer em se chegar a Deus, dizendo: Por que jejuamos nós, e tu não atentas para isso? Por que afligimos a nossa alma, e tu não o levas em conta? Eis que, no dia em que jejuais, cuidais dos vossos próprios interesses e exigis que se faça todo o vosso trabalho. Eis que jejuais para contendas e rixas e para ferirdes com punho iníquo; jejuando assim como hoje, não se fará ouvir a vossa voz no alto. Seria este o jejum que escolhi, que o homem um dia aflija a sua alma, incline a sua cabeça como o junco e estenda debaixo de si pano de saco e cinza? Chamarias tu a isto jejum e dia aceitável ao SENHOR? Porventura, não é este o jejum que escolhi: que soltes as ligaduras da impiedade, desfaças as ataduras da servidão, deixes livres os oprimidos e despedaces todo jugo?  Porventura, não é também que repartas o teu pão com o faminto, e recolhas em casa os pobres desabrigados, e, se vires o nu, o cubras, e não te escondas do teu semelhante? Então, romperá a tua luz como a alva, a tua cura brotará sem detença, a tua justiça irá adiante de ti, e a glória do SENHOR será a tua retaguarda;.” (Isaias 58.1-8)
Eles jejuavam, buscavam ter um conhecimento teologicamente correto, clamavam arrependimento, mas na prática nada vaziam. Não soltavam suas ligaduras com o pecado, nem mostravam misericórdia com o próximo. Eles jejuavam sem parar para refletir, apenas para que Deus os favorecesse em momentos oportunos de necessidade. Tal forma de jejuar nunca agradou a Deus e foi sempre repreendido por ele.

Jejuando da maneira correta

Finalmente chegamos ao aspecto positivo do ensinamento e passaremos a considerar agora qual deve ser a atitude correta do cristão diante da prática do jejum: “Tu, porém, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto, com o fim de não parecer aos homens que jejuas, e sim ao teu Pai, em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.” (Mateus 6.17-18).
O princípio para a atitude com que devemos realizar esta prática é o mesmo que para os outros exemplos que Jesus colocou anteriormente e consiste em praticarmos o jejum para Deus e diante dele ao invés de fazermos isto para os homens e diante dos homens. A nossa verdadeira preocupação tem que estar em agradar a Deus, em adorar a Ele e em buscar a glória dele, não a nossa. Se fizermos jejum, deve ser para clamar a Ele e não para sermos vistos diante dos homens. Jesus nos exorta a usarmos a máxima discrição possível. Os homens não precisam saber que nós jejuamos. O jejum não é uma atividade religiosa pública e menos ainda é uma atividade para recebermos o louvor dos outros.
Além disso, já vimos anteriormente o significado bíblico do jejum. Em base a tal significado, facilmente podemos inferir alguns aspectos para a prática do jejum. Primeiro, o jejum precisa ter um propósito claro, seja de dedicação, de súplica, de intercessão, enfim, não pode ser um ato mecânico, apenas uma rotina. Segundo, o verdadeiro jejum deve ser acompanhado de orações e meditação. É para nos aproximarmos mais de Deus. Novamente isto implica em que ele não pode ser um ato mecânico, pois é um instrumento de humilhação e aproximação a Deus, não uma mera rotina. Terceiro, o jejum é para ser praticado apenas quando somos movidos pelo Espírito Santo para fazê-lo e não pelo fato de ser uma obrigação que devemos cumprir para atingir uma meta espiritual preestabelecida. Isto implica, mais uma vez, que não se trata de uma ação mecânica e rotineira.
Finalmente podemos dizer que jejuar implica nos esquecermos de nós mesmos. Precisamente neste ponto estava o problema dos fariseus. Eles jejuavam pensando em si mesmos, em como eram visto pelos homens quando jejuavam. O jejum é uma forma de nos esvaziarmos das nossas próprias forças e nos humilharmos diante de Deus e, consequentemente, é o Pai que está nos céus que deve receber toda glória com este ato religioso. Não pense que você está fazendo grande coisa quando jejua, apenas agradeça a Deus por ter essa oportunidade e peça a Ele que o sustente durante a jornada de jejum de maneira que ele tenha toda a centralidade da sua meditação, reflexão e oração. Certamente o nosso Pai se agrada de tais adoradores, pois bem disse o nosso Senhor Jesus: “e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará” (Mateus 6,18b).
Que o Senhor nos ajude a vivermos de maneira agradável a Ele! Amém.